Corte Constitucional da Itália deve pacificar questão da cidadania, mas pode demorar


A recente decisão do Tribunal de Turim, que considerou inconstitucional o decreto que restringiu a concessão da cidadania italiana, reacendeu a esperança de milhares de descendentes de italianos, especialmente brasileiros, mas também trouxe incertezas sobre o futuro dos processos.
O juiz responsável pelo caso reconheceu o direito à cidadania em processo protocolado já sob o decreto-lei em vigor desde março, que restringe a cidadania a filhos e netos de italianos. O ponto central foi a interpretação de que aplicar restrições retroativas fere o Código Civil Italiano, que proíbe leis com efeito retroativo.
Mas a decisão foi encaminhada à Corte Constitucional, equivalente ao Supremo Tribunal Federal brasileiro, que deverá dar a palavra final sobre a constitucionalidade da nova regra — o que, segundo especialistas, deve ocorrer apenas no primeiro semestre de 2026.
Processos podem ser suspensos até decisão definitiva da Corte
De acordo com Matheus Reis, CEO da assessoria Io.Gringo, o envio do tema à Corte Constitucional faz com que muitos processos em andamento sejam suspensos, uma vez que a Justiça precisa de uniformidade em suas decisões. “Apesar disso, o ritmo acelerado com que o tema chegou à Corte suprema mostra que os juízes de primeira instância não concordam com o decreto”, avalia.
Mesmo com o cenário indefinido, a demanda segue alta: somente em maio, o Tribunal de Veneza registrou 900 novas ações judiciais de reconhecimento de cidadania italiana. Reis destaca que “a cidadania é um direito, não uma concessão do Estado”, mas recomenda cautela: quem deseja entrar com processo deve buscar orientação especializada para avaliar riscos e possibilidades antes de decidir.
Isso porque decisões como essas estimulam as pessoas a se sentir mais seguras para entrar com processo. Porém, como a matéria ainda não está pacificada, os especialistas alegam que é preciso avaliar os prós e contras e, só então, decidir se vale ou não a pena correr o risco de entrar com o pedido.
“É possível que a pessoa que entre com processo, além de não conseguir o que pede, ainda tenha de arcar com todas as custas processuais”, explica Reis. Por outro lado, se decidir esperar, ela poderá enfrentar regras mais limitantes, porém, com um caminho mais definido pela Corte .
Especialistas apontam direitos e riscos
O advogado Fábio Gioppo, especialista em cidadania italiana, explica que a decisão de Turim confirma o entendimento de que uma lei não pode retirar direitos já adquiridos. Já Andrew Montone lembra que, enquanto a Corte Constitucional não se pronunciar, não há decisão definitiva e o cenário segue incerto.
Os especialistas destacam que o julgamento em Turim representa sim um posicionamento importante do Judiciário italiano, que pode influenciar processos semelhantes em todo o país e abre precedentes favoráveis para descendentes que ainda buscam o reconhecimento.
O importante, segundo Reis, é que tudo isso mostra que a Justiça italiana ficou incomodada com a nova regra. “O decreto foi criado pelo Executivo, aprovado pelo Legislativo, mas não está convencendo o Judiciário, porque foi contra regras básicas da constituição italiana. Por isso, não sabemos o que deve ser decidido, mas já temos ideia do que a Justiça está pensando”, explica Reis.
O que mudou com o decreto?
O decreto aprovado em maio pela Câmara dos Deputados da Itália, após tramitar pelo Senado, representou a maior mudança nas regras de cidadania italiana em 90 anos. Entre os principais pontos, está a limitação do direito apenas a filhos e netos de italianos, eliminando a possibilidade de reconhecimento para bisnetos ou gerações posteriores.
Além disso, os filhos de italianos reconhecidos terão prazos curtos para serem registrados: até 31 de maio de 2026, para quem nasceu antes do decreto, e até o primeiro aniversário, para nascidos depois de 27 de março de 2025.
Outra mudança significativa é a eliminação da via administrativa: agora, apenas processos judiciais poderão ser utilizados para solicitar a cidadania, o que torna o caminho mais complexo e oneroso. Pedidos em comunas (prefeituras italianas) não são mais aceitos.
Como foi o caso do Tribunal de Turim
O pedido de cidadania foi feito por uma família venezuelana de descendência italiana. O juiz considerou a nova lei inconstitucional. Na avaliação dele, a alteração na regra deveria valer apenas para aqueles que nasceram após a publicação do texto (28 de março) e não para todos os processos protocolados depois dessa data, como diz a lei.
Baseando-se na lei anterior, o magistrado afirmou que a cidadania seria concedida. Considerando a nova regra, entretanto, o pedido seria negado. Por conta desse impasse, o juiz decidiu suspender o julgamento e remeter a questão da constitucionalidade da nova lei para apreciação da Corte Constitucional.
Impacto para brasileiros
O Brasil abriga uma das maiores comunidades de italianos e descendentes fora da Itália: mais de 700 mil cidadãos italianos vivem no país, segundo a Embaixada da Itália, e estima-se que existam cerca de 30 milhões de descendentes vivem no País. Dados do Eurostat, instituto de estatísticas da União Europeia, mostram que os brasileiros estão entre as dez nacionalidades que mais solicitaram cidadania europeia, com 70% desses pedidos concentrados em Itália e Portugal.
Diante da nova decisão e das mudanças recentes, especialistas reforçam que quem deseja solicitar a cidadania italiana deve estar preparado para um processo mais judicializado, que exigirá paciência, estratégia e suporte jurídico especializado, sobretudo enquanto a Corte Constitucional não se pronunciar de forma definitiva.
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Autor: Anna França