Gustavo Franco: o homem que viu FHC pedir demissão três vezes na mesma reunião
O então presidente do Banco Central, Gustavo Franco, participa de entrevista coletiva. Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo – 28/10/1997
O dia era 28 de fevereiro de 1994. O local, Brasília, mais precisamente o Palácio do Planalto. O presidente da época, Itamar Franco, convocara uma reunião com alguns ministros, entre eles Fernando Henrique Cardoso, titular da Fazenda. O domingo precedia um dia importantíssimo. Na segunda-feira seria editada a medida provisória 434 no Diário Oficial. Era o documento com 45 artigos que daria vida ao Plano Real.
Mas tudo poderia ter fracassado.
Entre ideias de fazer o salário mínimo chegar a US$ 100 e de retomar o congelamento de preços, Fernando Henrique pediu demissão do cargo três vezes na reunião. E nas três oportunidades ganhou o braço de ferro. Ficou na cadeira e o Plano Real mudou para a sempre a história do país.
“Aquele dia, aquele momento deu para ver que era decisivo e o ministro foi firme. Ele pediu demissão três vezes nessa reunião. Três vezes!”.
A frase é de Gustavo Franco.
Ex-secretário-adjunto da secretaria de política econômica do ministério da Fazenda e ex-presidente do Banco Central, Franco relembrou da história em entrevista exclusiva à Inteligência Financeira concedida na sala de seu apartamento no Rio de Janeiro recentemente. Franco fez parte da equipe que criou o Plano Real.
Gustavo Franco lembra que foi convocado por Fernando Henrique para ficar aguardando do lado de fora da sala onde ocorria o encontro. Era ele e Murilo Portugal, então secretário do Tesouro Nacional, na antessala.
O encontro começou meio-dia.
Então, chamam Murilo uma vez para a reunião, chamam Gustavo uma vez, duas vezes, três vezes. “Na terceira, disseram, ‘fica aí porque vai aparecer muita coisa’”, conta Franco. Foi realmente muita coisa.
Primeiro ponto de atrito.
Surge a ideia de converter os salários pelo pico, conferindo ganhos aos trabalhadores. A ideia vigorara no fracassado Plano Cruzado. Gustavo Franco lembra que Fernando Henrique diz, então, que não concordava e que iria embora. E se fosse assim, era melhor que o então ministro do Trabalho, Walter Barelli, conduzisse o real. FHC ganha o confronto.
Passa um tempo da reunião e surge outra proposta de última hora.
E se o Plano Real colocasse o salário mínimo a US$ 100? Franco conta que de novo Fernando Henrique levanta e sugere a Barelli assumir o comando. Mas é convencido a ficar, já que a nova proposta também não vinga.
“O terceiro assunto: controle de preços. ‘Ah, o congelamento, o povo quer congelamento’. E queria mesmo, que congelamento da tranquilidade às pessoas”. Franco conta que a resposta foi negativa e se o presidente não aceitasse, pela terceira vez, Fernando Henrique sairia do governo.
O então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, ao lado do presidente Itamar Franco. Foto: André Dusek/Estadão Coneúdo – 20/7/1993A equipe