‘Brasil é ausente’, afirma primeiro brasileiro conselheiro do Fórum Econômico Mundial
“Cadê o Brasil?”. Este era o principal questionamento de Guilherme Brammer, 47, nas duas vezes em que esteve presente no Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês), em Davos, na Suíça, nos anos de 2022 e 2023. O empreendedor sentiu a ausência de representantes brasileiros em painéis sobre o clima, a América Latina, a economia do empreendedorismo, entre outros temas relevantes para o país. Essas e outras percepções Brammer conta em entrevista ao InfoMoney.
Em sua primeira participação no WEF, Brammer foi à Davos receber o prêmio Inovador Social do Ano, concedido pela Fundação Schwab, uma das comunidades-irmãs do Fórum. A condecoração foi um reconhecimento pela sua atuação como fundador da greentech Boomera, uma firma que inovou ao unir indústria, academia e cooperativas de reciclagem de resíduos difíceis. Em 2023, o Grupo Ambipar (AMBP3) adquiriu a firma.
“Me assustou perceber que nosso país estava de fora de conversas tão importantes sobre a América Latina e assuntos que temos condições de ser protagonistas”, diz Brammer. Em sua indignação, fez questionamentos à Fundação Schwab e outros organizadores, o que resultou em um convite inédito para o Brasil, em 2024, para ser conselheiro executivo do Centro de Natureza e Clima.
A partir de 2025, Brammer levará o Brasil para a mesa de discussões sobre desafios globais como mudanças climáticas, descarbonização e desenvolvimento econômico sustentável. Seu papel é visto como estratégico neste ano em que o país sediará a COP 30, no Pará, em novembro.
Ao InfoMoney, o empreendedor social fala sobre a estrutura do Fórum Econômico Mundial, sua atuação e relevância global, como pretende melhorar a participação do Brasil e o legado que quer deixar na sua gestão.
InfoMoney: Como foi seu primeiro contato com o Fórum Econômico Mundial e sua percepção sobre o evento?
Gui Brammer: Em 2019, ganhei um prêmio de Empreendedor Social pela Folha e a Fundação Schwab, que me projetou e acabei ganhando um segundo prêmio, só da Fundação, este para receber lá em Davos, em 2021. Foi meu primeiro contato com o Fórum, em Davos. Até aquele momento, achava que era um encontro anual de políticos e empresários.
Mas eu estava enganado. Logo de cara percebi que era muito mais. É um lugar de fomento de ideias, de networking internacional e todo mundo entende que se você está ali, é porque tem algo a acrescentar ou oferecer. As pessoas que estão ali são os decisores, presidentes, ministros de economia, CEOs e executivos de modo geral.
Na mesa do jantar tinha o Al Gore, passando pelo corredor você tromba com o Bill Gates. São pessoas muito importantes que estão ali para ouvir, fazer acordos, entrar em projetos e fechar negócios.
IM: Como você passou de espectador nesse universo para participante ativo, como conselheiro de um centro de estudos do Fórum?
GB: Na primeira vez que eu fui, em 2022, percebi que a participação do Brasil era muito pequena. Quase não tinha representantes. Quando tinha, a maioria era de baixo escalão. Isso me chamou a atenção e eu comecei a fazer perguntas: porque não estavam lá? Foram convidados? Era sempre assim? Problema de interesse ou falta de informação?
Depois do evento, mantive contato com a Fundação Schwab e eles me convidaram para voltar, dessa vez nos bastidores. Foi uma surpresa, é muito raro que isso aconteça. Foi aí que eu entendi o que era o fórum, todos os eventos que acontecem ao longo do ano, além de Davos, os centros de estudos, a estrutura, projetos. Tudo.
Eu já tinha vendido a Boomera para a Ambipar e comecei a participar de mais painéis e me dedicar aos encontros. De tanto insistir sobre o Brasil e me fazer presente, o convite aconteceu. Uma honra. Um papel inédito para um brasileiro em um ano importante, o da Cop 30.
IM: Qual será o seu papel como conselheiro e como pretende melhorar a representação do Brasil no evento?
GB: O papel de conselheiro é um convite feito a dez pessoas por ano e tem duração de um ano, renovável por mais um. Estou no Centro de Natureza e Clima, que trabalha com os temas de descarbonização, economia circular e social business, principalmente. Quero levar firmas nacionais para esse ecossistema, mostrar que temos bons projetos em biociência, transição energética, reflorestamento.
Está nas minhas funções ajudar a montar uma agenda do Fórum Econômico Mundial na Cop 30, tropicalizar programas em que já atuam para trazer para um formato que faça sentido no Brasil. O trabalho de comunicação dessas agendas e do potencial do WEF precisam melhorar.
Aqui no Brasil se tem muito desconhecimento sobre o Fórum, mesmo entre as firmas, e isso é muito complicado. Alguns executivos dizem que é uma realidade muito distante, outros falam que é uma questão de idioma (porque precisa ter um bom inglês). O Fórum tem entendido que precisa se comunicar melhor sobre o que fazem e quais são os objetivos.
IM: O que eles fazem e quais são esses objetivos?
GB: Davos é um grande encontro, é o principal do Fórum e serve para pautar o ano. Especialistas e governos se reúnem em janeiro para discutir os principais assuntos e a partir daí começam os trabalhos. São 400 encontros ao longo do ano para trabalhar nos projetos que são sugeridos e desenvolvidos pelos centros de estudos. Dá para dizer assim: se o Fórum fosse um filme, Davos é o roteiro.
Os programas são lançados depois de Davos com tudo decidido: tem liderança, definição sobre o dinheiro a ser levantado e aportado, em quais formatos. É uma coisa viva, com pessoas responsáveis, metas e acompanhamento. Isso serve para governos que implementam os projetos e para firmas também.
E não só grandes firmas. Os mais de 500 empreendedores que vão lá vender suas ideias atrás de investimento, dificilmente saem de mãos vazias. É um nível de preparação e networking que nunca tinha visto. Fiz amigos da Índia, de países da África e América Latina também que me ensinaram muito. Todos vão com o discurso pronto, o CEO mapeado, já sabendo com quem precisam falar e quanto querem receber. Completamente prontos.
IM: Depois do resultado fraco da COP 29, há dúvidas sobre o potencial de Davos neste ano. Você vê o evento perdendo adesão e força globalmente? O que espera da edição deste ano para o mundo e para o Brasil?
GB: O WEF não é político ou limitado à questão climática. É muito mais centrado no mercado monetário, questões sobre o novo mundo. Estamos falando de pautas como IA para melhorar a saúde, economia circular para melhorar a produção, regeneração de florestas, esse tipo de discussão. É pragmático. Quando se tem clareza disso, há muito mais interessados.
A COP deu uma esvaziada com a chegada de novas lideranças que não estão alinhadas a alguns temas. Mas não vejo isso acontecendo no Fórum. Trump, por exemplo, não deve ir, mas representantes dos Estados Unidos com certeza vão estar lá, assim como outros países que têm governos menos alinhados com questões climáticas.
Por causa da COP 30, o Brasil deve ser tema no Fórum. A América Latina está em pauta, de modo geral. A Colômbia é sempre forte. Chile também, mas a Colômbia entendeu mais como funciona a dinâmica do Fórum. As firmas brasileiras são poucas que entendem o ecossistema, ainda temos um trabalho de construção para mostrar o potencial do encontro.
O Fórum trabalha com a ideia de capitalismo de stakeholders, social business, trabalhar em projetos com propósito voltado para problemas sociais e ambientais, mas com visão de lucro para as firmas. Tem muita coisa já funcionando lá fora, que temos que trazer para o Brasil.
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Autor: Monique Lima