Cosan pode viver a transição mais delicada desde que Rubens Ometto assumiu o comando
A Cosan está prestes a viver uma das transições mais importantes da sua história. Com uma dívida de R$ 17,5 bilhões, o grupo fundado por Rubens Ometto se prepara para a entrada de novos sócios: o banco BTG Pactual, de André Esteves, e a gestora Perfin.
A oferta de ações que vai garantir a entrada desses sócios e uma injeção de até R$ 10 bilhões na Cosan está em análise pelos acionistas e deve ser votada em assembleia marcada para o dia 23 de outubro.
Se aprovada, a operação pode mudar o equilíbrio de poder num conglomerado onde, por mais de três décadas, Ometto teve a palavra final.
A mudança deve ser gradual. Ao final da operação de entrada dos novos sócios o BTG Pactual passará a ser o maior acionista individual da Cosan. Mas, pelo acordo firmado entre o banco, a Perfin e a holding da família Ometto, Rubens preservará sua condição de controlador e a presidência do conselho de administração até 2031, quando completará 81 anos.
Depois desse período, BTG e Perfin poderão atrelar mais papéis da Cosan ao acordo de acionistas e, com isso, mudar a composição do bloco de controle.
A entrada dos novos sócios, é claro, não ocorre em um momento qualquer. O império que começou com usinas de cana-de-açúcar no interior paulista e hoje abrange etanol, energia, ferrovias, gás natural e lubrificantes, mas carrega um nível de alavancagem que ameaça a autonomia que Rubens Ometto sempre defendeu com unhas e dentes.
Para conter a escalada da dívida, a Cosan iniciou uma sequência de desinvestimentos. Ao longo de 2025, a companhia vendeu sua participação minoritária na Vale, além de usinas e ativos de energia e açúcar. Também se desfez da sociedade com o Grupo Nós, que operava os minimercados Oxxo no Brasil.
Um império construído no conflito
A centralização de poder nas mãos de Ometto não é acaso. Ela vem de uma trajetória marcada por disputas familiares e decisões solitárias.
Ometto nasceu em uma das famílias mais tradicionais do setor sucroenergético de Piracicaba (SP), herdeira da Usina Junqueira, fundada em 1936 por seu avô, o imigrante italiano Pedro Ometto.
Mas o negócio familiar era dividido entre sete irmãos, o que alimentou conflitos por poder e gestão. A mãe de Rubens detinha apenas 11% do patrimônio, e o jovem engenheiro chegou a planejar carreira fora do ramo. Trabalhou quase dez anos no Grupo Votorantim, como braço direito de José Ermírio de Moraes Filho, experiência que moldou seu estilo de comando — austero e voltado para resultados.
A volta aos negócios da família aconteceu por acaso, quando o tio Orlando Ometto adoeceu e pediu ajuda. Rubens assumiu parte das operações, mas, após a morte do tio, foi afastado pelos primos. O conflito se transformou em uma batalha judicial de cinco anos, encerrada em 1993, que lhe devolveu o controle.
Pouco depois, ele enfrentou a própria mãe e os irmãos ao propor a criação de uma holding para unificar as usinas sob gestão profissional. Saiu novamente vitorioso — e livre para consolidar o império que sonhava.
A ascensão da Cosan
Nos anos seguintes, Ometto comprou usinas endividadas, abriu o capital da Cosan na B3 (2005) e na Bolsa de Nova York (2007), e expandiu para novos segmentos. Em 2008, adquiriu os postos da Esso e, em 2011, criou a Raízen, em uma joint venture com a Shell.
Vieram ainda a Rumo, braço de ferrovias e logística; a Radar, de gestão de terras agrícolas; a Moove, de lubrificantes, e a Compass, distribuidora de gás natural.
Por quase duas décadas, Ometto comandou uma expansão agressiva e diversificada, que colocou a Cosan entre os dez maiores grupos firmariais do Brasil, com faturamento anual de cerca de R$ 45 bilhões.
A aposta na Vale — e o início da virada
Mas a decisão de entrar na Vale, em 2022, marcou um ponto de inflexão. A Cosan desembolsou R$ 18,5 bilhões para comprar uma fatia minoritária na mineradora — uma jogada rara para Ometto, que sempre preferiu ter o controle total de suas firmas.
O objetivo era influenciar a sucessão no comando da Vale e indicar um nome de confiança para o cargo de CEO. A disputa, porém, envolveu outros grandes acionistas e até o governo federal, e terminou sem vitória para nenhum dos lados. O episódio deixou a Cosan com uma dívida pesada em meio ao ciclo de juros altos, forçando a venda da própria participação na Vale.
Mesmo assim, a pressão financeira continuou — e a entrada do BTG e da Perfin agora aparece como uma solução inevitável.
Um novo jogo de poder
O acordo proposto prevê duas etapas de capitalização: a primeira, de R$ 7 bilhões, seria subscrita integralmente pelo consórcio formado por Ometto, BTG e Perfin. A segunda, de até R$ 2,75 bilhões, ficaria disponível aos acionistas minoritários.
A figura central dessa nova fase é André Esteves, que, além de comandar o BTG, tem participação minoritária relevante na Perfin. Sua presença insere o banco de investimento no coração de um conglomerado que impacta diretamente o PIB brasileiro.
Rubens Ometto tem duas filhas, que não participam da gestão, e netos ainda jovens. Em entrevistas, o empresário sempre disse não fazer questão de que sua família trabalhe nos negócios.
A Cosan nasceu de conflitos familiares e chegou ao topo sob o controle centralizado de um único homem. Agora, seu futuro dependerá da capacidade de dividir poder sem perder a direção.
Se a entrada do BTG e da Perfin marcar o início de uma nova era, a Cosan pode se transformar de um império familiar em um grupo corporativo de capital aberto — e Rubens Ometto, o engenheiro que passou a vida lutando para concentrar o controle, talvez esteja prestes a protagonizar a sua sucessão mais desafiadora.
O InvestNews procurou Rubens Ometto, mas o empresário não concedeu entrevista.
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Autor: Letícia Toledo