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Nova era do dinheiro: bancos e cartões de crédito se rendem às criptos em busca do Pix global

Desde a criação do Pix, esperar ao menos um dia útil e ainda pagar uma taxa para fazer uma simples transferência bancária tornou-se inaceitável para os brasileiros. Hoje, qualquer transação eletrônica feita no Brasil ocorre em tempo real, desde que o correntista opte por esse arranjo monetário. Já quando o destino final do dinheiro é outro país, a realidade muda completamente: o depósito pode levar dias para ser concluído, além de envolver custos que encarecem o valor final da operação.

Nos últimos anos, porém, os principais bancos do mundo e até operadoras de cartão de crédito parecem estar dispostos a mudar essa realidade. Movimentos recentes refletem a atenção dessas instituições financeiras ao potencial disruptivo que o mercado de criptomoedas pode oferecer ao sistema monetário tradicional. Nesse contexto, as stablecoins despontam como a principal aposta para viabilizar a transformação.

Isso acontece porque esses ativos buscam manter seu valor igual ao de uma moeda fiduciária, como o dólar, e ainda carregam a tecnologia necessária para reduzir o tempo e o custo das operações transfronteiriças. Ou seja, por meio da rede blockchain (sistema onde as transações de criptomoedas são registradas), as pessoas ou firmas podem realizar operações financeiras para qualquer lugar do mundo em tempo real.

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A possibilidade tem despertado a atenção das instituições financeiras que já estudam soluções ou produtos para finalidades que vão além do investimento.

No início do mês de outubro, a agência Reuters noticiou que Bank of America (BofA), Deutsche Bank, Goldman Sachs, UBS e outros seis grandes bancos estudam a emissão de uma stablecoin lastreada em moedas do G7, grupo que reúne as economias mais industrializadas e desenvolvidas do mundo. O movimento reforça o interesse do sistema monetário tradicional em incorporar as inovações do universo cripto aos seus modelos de negócio.

O episódio não é isolado no sistema monetário tradicional. No fim de setembro, a Visa (VISA34) anunciou o lançamento de um projeto-piloto que permitirá às firmas financiar pagamentos internacionais com stablecoins, como alternativa às moedas fiduciárias.

O objetivo, segundo a gigante de cartões de crédito, busca flexibilizar o gerenciamento dos pagamentos globais e garantir às firmas maior previsibilidade, visto que esses ativos digitais reduzem a exposição às volatilidades das moedas locais. Já em 2020, a companhia anunciou o uso da USDC, stablecoin lastreada em dólar americano, para liquidar transações financeiras. A novidade possibilita que bancos emissores e credenciadores paguem suas obrigações financeiras com a Visa via blockchain.

“As stablecoins vêm encontrando grande utilidade prática. Elas conseguem combinar a confiança do sistema monetário tradicional com os benefícios da tecnologia blockchain, como liquidação instantânea, disponibilidade 24h por dia e alta programabilidade”, diz Catalina Tobar, diretora executiva de produtos e de parceria da Visa para América Latina e Caribe, em entrevista ao E-Investidor.

As particularidades do ativo possibilitaram um crescimento expressivo nos últimos anos. Em 2022, quando o mercado de criptomoedas enfrentava períodos de “bear market” (período de queda prolongada), a captalização de mercado das stablecoins era de US$ 161,8 bilhões segundo dados do Mercado Bitcoin, enviados à reportagem.

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Já em janeiro de 2025, quando Donald Trump tomou posse como presidente dos Estados Unidos com a promessa de adotar uma agenda econômica favorável ao setor cripto, esses ativos valiam US$ 210,1 bilhões. E em menos de 10 meses, esse volume saltou para US$ 304,5 bilhões, o que representa um aumento de 44,9% durante o período.

“O crescimento das stablecoins é expressivo”, complementa Tobar.

Stablecoins são a “bola da vez”?

O interesse por esse mercado ganhou força após Trump sancionar, em julho deste ano, a lei GENIUs Act. A legislação criou no mercado americano uma série de regras para a emissão de stablecoins. Agora, esses tokens precisam ter uma garantia de reserva com ativos líquidos, como dólares americanos ou títulos do tesouro de curto prazo.

O texto exige ainda que os emissores façam divulgações públicas mensais sobre a composição das reservas. Já para os casos de insolvência (falência), a nova lei determina que haja prioridade a pagamentos dos detentores do ativo digital sobre todos os outros credores. A novidade reduziu a maior parte das incertezas regulatórias desse mercado que impediam a adoção massiva das stablecoins pelas instituições financeiras.

A legislação surge em um momento oportuno para esta indústria após crises em decorrência da ausência de regras claras para suas emissões.

Em maio de 2022, o mercado cripto viu a sua credibilidade ruir com o colapso do ecossistema Terra Luna, responsável pela stablecoin UST. O ativo digital criado para ter uma paridade de 1 a 1 com o dólar americano sucumbiu após sofrer um resgate em massa dos investidores.

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Mas com o avanço regulatório nos EUA, as instituições financeiras possuem maior segurança jurídica para pensar em iniciativas que possam adequar às transferências transfronteiriças à dinâmica global.

“A partir do momento que os EUA definem a sua regulamentação, outros países tendem a seguir. Hoje, transferências via stablecoins são possíveis, mas envolvem riscos altíssimos ainda não totalmente compreendidos pelo sistema tradicional”, diz Hugo Eduardo Meza Pinto, professor universitário e especialista em criptomoedas.

Hoje, apenas 54,6% dos pagamentos internacionais são creditados em até uma hora após a iniciação do pagamento. Já o custo médio das transações internacionais entre firmas permanece em torno de 1,6%, enquanto entre pessoas físicas salta para 2,6%. Os dados são do relatório do Conselho de Estabilidade Financeira (FSB, na sigla em inglês), órgão internacional que monitora e faz recomendações sobre o sistema monetário global.

A realidade, no entanto, muda de região para região. No Leste Asiático e no Pacífico, as taxas para pagamentos de até US$ 499 giram em torno de 1,8% e passam para 3% quando o valor da transação está entre US$ 500 a US$ 4,9 mil. Esses porcentuais estão acima da média global, que permanece em 1,3% e 0,9% para as mesmas quantias, respectivamente.

Já na América Latina e no Caribe, as transações abaixo de US$ 500 apresentam um custo médio de 1,9% sobre o valor final. Mas, para valores acima desse limite e que não ultrapassam os US$ 4,9 mil, o custo cai significativamente para 0,2%.

“Cada país tem regulamentações de prevenção à lavagem de dinheiro e os dados que precisam ser compartilhados são diferentes. Há vários processos manuais envolvidos, que aumentam o custo operacional e isso é repassado para o cliente final”, explica Juarez Borges Filho, general manager do Checkout.com no Brasil, plataforma de soluções para pagamentos digitais.

Relatório da Wise, plataforma de serviços financeiras, aponta que, em 2025, firmas e consumidores devem acumular um prejuízo de US$ 274 bilhões em taxas ocultas de câmbio e encargos sobre pagamentos transfronteiriços. A estimativa considera apenas os países do G20, grupo que reúne as 19 mais economias do mundo mais União Europeia e União Africana.

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No Brasil, a projeção é de aproximadamente US$ 3 bilhões em gastos com essas tarifas.

Segurança ainda é um dilema

Os recentes avanços regulatórios nos Estados Unidos sozinhos não são suficientes para institucionalizar o uso das stablecoins. Daniel Mangabeira, vice-presidente de estratégia e política no Brasil e na América Latina na Circle – segunda maior emissora de stablecoins do mundo –, explica que é preciso haver uma harmonização entre as jurisdições de cada para viabilizar a integração desses ativos ao sistema monetário tradicional.

“Se cada país criar regras diferentes, teremos ‘ilhas regulatórias’ que dificultam a adoção global e reduzem o potencial dessa inovação”, ressalta Mangabeira.

Em 2022, o Congresso brasileiro aprovou a lei 14.478/22 que determina uma série de regras para a operação das corretoras de criptomoedas e penalidades em casos de crimes monetários, envolvendo ativos virtuais.

A legislação também atribuiu para o Banco Central (BC) a elaboração de uma regulamentação mais completa para preencher as lacunas regulatórias que não foram contempladas pela nova legislação. A expectativa do setor é que o texto seja publicado ainda em 2025.

O pacote de regras do BC deve organizar a atuação desse mercado no Brasil e servir de exemplo para outros países emergentes. No entanto, a atuação da autoridade monetária não se resume apenas a esse movimento.

O Banco Central está desenvolvendo a sua moeda digital (CBDC, na sigla em inglês) que será chamada de Drex. A tecnologia será a versão digital do real e possibilitará, segundo o BC, habitar esse novo dinheiro para contratos inteligentes que permitem a execução de acordos ou transações quando todas as condições pré-determinadas forem cumpridas.

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A autarquia monetária também está desenvolvendo a uma blockchain fechada, denominada como DLT (Distributed Ledger Technology). A rede digital vai permitir que apenas as instituições financeiras autorizadas e reguladas pelo BC atuem nesse espaço. O objetivo é garantir escalabilidade e segurança para o mercado monetário.

Para Borges Filho, a inovação tem grandes chances de “roubar” o protaginismo das stablecoins visto que essas moedas digitais, por serem controladas pelo Estado, devem oferecer ao mercado algo que as criptomoedas ainda não conseguem prometer: o nível de segurança que o sistema monetário tradicional exige.

“Vejo o Drex como uma inovação que vai trazer padronização de informações e servir como facilitador para que o Pix se torne internacional”, diz o especialista. “Um dos pontos de preocupação global é a cibersegurança porque, se o sistema sofrer uma ataque hacker, as consequências são inimagináveis”, complementa.

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Esta notícia foi originalmente publicada em:
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Autor: Daniel Rocha

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