Por que o xisto de Vaca Muerta está atraindo os olhos do mundo (e dos investidores) para a Argentina

As abundantes bacias de xisto dos Estados Unidos estão ficando sem seus melhores poços, mas Vaca Muerta, na Argentina, está apenas começando. Mas será que a regulamentação pró-negócios será suficiente para iniciar um boom de xisto no país sul-americano?
A perfuração horizontal na bacia decolou há cerca de uma década, mas a regulamentação desfavorável — incluindo controles de capital e moeda, impostos de importação e exportação e intervenções no preço do petróleo, entre outras coisas — prejudicou seu crescimento.
A inflação alta e uma economia instável também foram barreiras para atrair capital para o xisto. A Exxon Mobil, por exemplo, concordou em vender seus negócios na Argentina no ano passado. A Shell e a Chevron ainda mantêm interesses na bacia.
A bacia de xisto tem visto mais sinais de vida nos últimos anos. A questão é se as mudanças pró-negócios de Javier Milei, que assumiu a presidência do país há mais de um ano, serão suficientes para acelerar o crescimento.
A produção de petróleo atingiu cerca de 440 mil barris por dia, e as firmas de pesquisa estimam que possa chegar a um milhão de barris diários até 2030. Esse ainda é um número relativamente pequeno, representando cerca de 15% do que a Bacia do Permiano produziu no último trimestre de 2024.
Mas a Administração de Informação Energética dos EUA (EIA na sigla em inglês) estima que haja cerca de 16 bilhões de barris de óleo de xisto tecnicamente recuperável e condensado em Vaca Muerta. A Argentina está entre os cinco maiores detentores mundiais de xisto e gás natural, de acordo com estimativas da EIA.
Se o crescimento de Vaca Muerta permanecer no ritmo observado nos últimos anos, a produção diária real da bacia deve facilmente exceder o limite de um milhão de barris, disse Patrick Rutty, diretor de inteligência global da Enverus. A bacia também produz gás natural, que o país espera exportar na forma liquefeita.
As ações dos dois principais produtores da bacia estão refletindo o otimismo. O valor das ações da petrolífera argentina YPF, de propriedade majoritariamente estatal, dobrou desde que Milei assumiu o cargo. As da Vista Energy, produtora independente fundada por um ex-CEO da YPF, subiram cerca de 50% no mesmo período.

As mudanças de Milei até agora tornaram o país mais amigável ao investidor. A hiperinflação foi interrompida e o índice de risco-país da Argentina, de acordo com o JPMorgan, caiu pela metade desde que ele assumiu o cargo. O governo removeu os limites para o preço do petróleo e introduziu um plano de incentivo que oferece condições favoráveis para grandes investimentos, como os exigidos em projetos caros de oleodutos. Milei também prometeu acabar com os controles de capital e moeda.
As firmas de energia argentinas estão retornando aos mercados internacionais de dívida “após anos de isolamento”, disse a S&P Global em um relatório no início deste ano. A YPF conseguiu vender US$ 1,1 bilhão em títulos para investidores internacionais em uma rodada em janeiro, enquanto a Vista Energy levantou US$ 750 milhões na venda de títulos denominados em dólares no final do ano passado. O capital estrangeiro deve ajudar as firmas a financiar grandes projetos, como oleodutos que ajudam a levar o petróleo aos mercados.
Muitos analistas do setor concordam que o xisto de Vaca Muerta é, em muitos aspectos, superior ao dos EUA. Em média ao longo do período de 12 meses até fevereiro, os poços de Vaca Muerta tiveram uma recuperação final estimada — métrica que captura a quantidade total de petróleo que deve ser recuperada até o final de sua vida útil — de cerca de 86 barris por 0,3 metro perfurado, de acordo com dados da Enverus. As bacias dos EUA, por outro lado, tinham produtividade variando de 43 a 72 barris em área equivalente. Mesmo quando as bacias de xisto dos EUA estavam em seus estágios iniciais de produção, sua produtividade nunca chegou perto da de Vaca Muerta.

O custo para perfurar um poço é mais alto na Argentina, que carece da extensa infraestrutura e presença de serviços de campos de petróleo que os EUA têm. Mas a maior produtividade significa que a produção de Vaca Muerta pode lucrar com o preço do petróleo mais baixo em comparação com as bacias de xisto dos EUA, disse Andres Villarroel, analista de xisto da Rystad Energy.
Claro, há razões para o ceticismo. A história da Argentina está cheia de mudanças políticas dramáticas, de acordo com uma postagem de dezembro no blog do think tank Atlantic Council. “Muitos investidores provavelmente estão esperando para ver se o plano de estabilização do governo Milei está correndo bem, talvez ainda mais importante, evidências concretas de que o país realmente mudou”, disseram Ignacio Albe e William Tobin no post.
Contudo, enquanto as condições econômicas permanecerem razoavelmente estáveis, o crescimento da produção de Vaca Muerta deve atrair os produtores americanos, que estão ficando sem bons locais para perfurar. Vaca Muerta é “uma das poucas regiões de xisto” com grandes expectativas de crescimento da produção, disse Andy McConn, diretor de pesquisa comercial da Enverus. O crescimento da produção de petróleo de xisto dos EUA se estabilizou no ano passado, de acordo com dados da EIA.
Bill Von Gonten, executivo-chefe da firma de consultoria de engenharia de petróleo W.D. Von Gonten Engineering, disse que tem recebido ligações de firmas de energia americanas interessadas na bacia desde que apareceu em um podcast no ano passado para falar sobre Vaca Muerta. “Recebo cerca de uma ligação por semana”, disse ele. A firma trabalha em Vaca Muerta desde 2012 e seus clientes incluem a Vista Energy. Von Gonten disse que as firmas americanas estão inicialmente procurando se juntar a firmas de energia locais, em vez de estabelecer suas próprias operações.
Villarroel, da Rystad, acha que as firmas americanas precisam ver o fim dos controles cambiais antes de se sentirem confiantes o suficiente para investir substancialmente na bacia. Milei afirmou que planeja eliminar esses controles em 2026, mas essa medida pode depender de o país obter um empréstimo do Fundo Monetário Internacional.
As principais firmas petrolíferas com participações em Vaca Muerta recentemente pareceram otimistas sobre as perspectivas do país. O CEO da Shell, Wael Sawan, disse em uma teleconferência de resultados em janeiro que a firma está “encorajada pelo que estamos vendo do novo governo”. O CEO da Chevron, Mike Wirth, disse em uma teleconferência de resultados no início deste ano que está “muito satisfeito ao ver a situação do país melhorando”. Milei é “um reformador e tem uma agenda séria que tornaria o país mais atraente para investidores estrangeiros”, disse Wirth.
A Shell foi a terceira maior produtora de petróleo na bacia em 2024, em termos de operação, segundo a Rystad. A Chevron opera uma parcela menor, mas tem participações em joint ventures operadas pela YPF. As duas grandes petrolíferas concordaram em investir em um importante oleoduto conhecido como Vaca Muerta Sur. A Argentina pode se tornar uma parte mais importante dos negócios da Chevron na América do Sul: o governo Trump revogou na terça-feira sua licença para bombear petróleo venezuelano. E sua compra planejada de ativos na Guiana — por meio da aquisição da Hess — ainda está no ar por causa de uma disputa com a Exxon Mobil.
Se produtores americanos independentes mais ousados se aventurarem em Vaca Muerta, é pouco provável que assumam grandes riscos novamente — em grande parte porque seus investidores não tolerarão gastos desenfreados. Von Gonten estima que mais de 90% do petróleo está sendo deixado para trás no Permiano porque os produtores estavam inicialmente focados em lucros de curto prazo visando os poços mais produtivos, não na recuperação de petróleo de longo prazo.
Um boom de xisto é possível na Argentina, mas provavelmente não se parecerá com o americano. Isso pode ser uma coisa boa.
Escreva para Jinjoo Lee em jinjoo.lee@wsj.com
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Esta notícia foi originalmente publicada em:
Fonte original
Autor: The Wall Street Journal